Sep 24, 2008

Gael García Bernal fala sobre personagem de Ensaio sobre a cegueira

RIO - No fim do ano passado, durante uma visita à Cuba, o ator Gael García Bernal de repente percebeu que havia perdido os cartões de crédito. Durante cinco dias, o rosto mais internacional da nova geração de atores mexicanos se viu com quase nenhum dinheiro no bolso num país estrangeiro.

– Eu me obrigava a fazer pequenas escolhas: ir ao cinema, tomar uma cerveja ou dormir? Depois do pânico inicial, enxerguei ali uma experiência libertadora. Situações extremas nos obrigam a voltar ao básico, ao que é mais importante – conta o ator de 29 anos ao Jornal do BrasiL, sobre Ensaio sobre a cegueira, que no Brasil já arrebanha 280 mil espectadores.

O ator recorre ao episódio para traçar uma analogia para o que acontece no longa-metragem dirigido pelo brasileiro Fernando Meirelles, no qual uma estranha epidemia tira a visão dos habitantes do planeta, causando um profundo colapso na sociedade. Adaptação do romance homônimo do português José Saramago, o filme levou uma surra da crítica estrangeira quando exibido em Cannes

– Saramago é um grande analista da condição humana e tem uma visão bastante cínica sobre ela. Em Ensaio sobre a cegueira, ele cria um ambiente extremo para nos lembrar que a civilização está à beira da falência, e que é preciso nos atermos ao básico para que garantir a nossa integridade e continuarmos evoluindo – resume Gael, que trabalhou com Walter Salles em Diários de motocicleta (2004), de Walter Salles, e O passado (2007), de Hector Babenco.

Na trama recriada por Meirelles para o cinema, coube a Gael o papel de O Rei da Ala 3 (no livro e no filme, os personagens não têm nome, são identificados pela função), o elemento desestabilizador da já frágil organização criada pelas primeiras vítimas da misteriosa praga, alojadas em um manicômio abandonado. Num espaço onde o estado e instituições não entram, ele impõe a lei da submissão ao mais forte, criando uma horda de criminosos violentos, que exigem ração e as mulheres das demais unidades da instituição.

– A natureza nos oferece duas opções, a civilização organizada e a lei do mais forte, a barbárie. O Rei da Ala 3 representa o extremo dessa segunda opção, que é matar para sobreviver. O que, no fundo, é uma alternativa kamikaze – entende o ator, que confere ao personagem uma interpretação raivosa, enfurecida. – Não sabemos nada sobre o passado dele, mas tendo a achar que não nasceu uma pessoa má, apenas se adaptou, de forma orgânica, ao mundo em torno em torno de si.

A morte lhe cai bem

Gael leu Ensaio sobre a cegueira pela primeira vez quando tinha 18 anos. Mas só veio conhecer o seu autor, de quem é admirador confesso, em 2006, por ocasião de uma feira de livros na cidade mexicana de Guadalajara, na qual o escritor português era um dos principais convidados. Durante o encontro literário, Gael e Saramago participaram da dramatização de trechos do romance As intermitências da morte (2005). Nele, o escritor cria uma situação extraordinária e hipotética para, mais uma vez, confrontar a sociedade e a natureza humana: a morte apaixona-se por um músico e decide suspender suas atividades macabras.

– Eu interpretei a morte e o Saramago, o músico. Ele se revelou um grande ator – elogia o ator, que estreou na direção de filmes ano passado, com Déficit, um drama que revela o abismo social mexicano, no qual Gael expõe, do outro lado da câmera, sua faceta politizada.

Ao lado de nomes como Jane Campion, Gaspar Noé, Gus Van Sant e Wim Wenders, Gael participa do projeto 8, longa-metragem em episódios no qual cineastas desenvolvem curtas sobre os desafios do mundo contemporâneo.

– Acredito que a ficção pode mudar o mundo, mas ela não precisa ser baseada, necessariamente, na realidade – analisou o ator. – As pessoas não podem exigir essa responsabilidade dos filmes de fundo político ou social. O cinema, na verdade, me transformou mais como pessoa na medida em que eu faço filmes.

Carlos Helí de Almeida, Jornal do Brasil


1 comment:

Sarah said...

Esse filme é simplismente maximo...e o Gael García Bernal é otimo eu adorei ele em todos os trabalhos dele q pude acompanhar...blog massa continua assim

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